UCPel e UFPel concedem título de Doutor Honoris Causa ao professor Boaventura de Sousa Santos

Os Conselhos Universitários das Universidades Católica de Pelotas (UCPel) e Federal de Pelotas (UFPel) estarão reunidos no dia 04 de junho para outorgar, duplamente, o título Doutor Honoris Causa ao professor português Boaventura de Sousa Santos. A cerimônia, aberta à comunidade, ocorre às 19h, no Teatro Guarany, e será seguida de palestra do homenageado, intitulada: “Democratização da Universidade: construindo alternativas ao capitalismo, colonialismo e patriarcado”.
A união das duas instituições na homenagem se dá, especialmente, pela contribuição da bibliografia de Boaventura para a democratização da universidade. O professor português é reconhecido internacionalmente por sua colaboração teórica e pela sua posição militante em favor de um projeto pluralista e amplo de emancipação social.
De acordo com a professora do Programa de Pós-Graduação em Política Social e Direitos Humanos (PPGPSDH/UCPel), Aline Mendonça dos Santos – pesquisadora e integrante da equipe de Boaventura-, o professor é referência na produção do conhecimento científico há muito tempo. “Ele é um dos intelectuais que vai propor repensar os paradigmas de produção do conhecimento científico”, informa.
Do começo da sua vida acadêmica aos dias de hoje, Boaventura vem produzindo um arcabouço epistemológico que passa pelo projeto Alice (voltado para desenvolver novos paradigmas teóricos e de transformação social para as sociedades contemporâneas); pela A crítica da razão indolente (série de livros sobre paradigma da modernidade e análise para pensar a modernidade fora dos cânones do paradigma dominante nos últimos 200 anos); e Epistemologias do Sul, (obra sobre as teorias pós-coloniais que contesta a produção do conhecimento pautada pelo eurocentrismo e nortecentrismo).   
Para além da contribuição epistemológica, Boaventura também é uma referência política na América Latina e especialmente no Brasil. Sua tese de doutorado foi realizada em uma comunidade do Rio de Janeiro e tentou compreender a forma em que o Direito e o Estado se relacionam com a sociedade. “Através da tese ele propõe a realização de uma pesquisa que não seja extrativista, mas sim construtivista com os sujeitos que vivem nos espaços”, explica Aline. 
Boaventura é ainda uma das principais figuras do Fórum Social Mundial. Através da Universidade Popular dos Movimentos Sociais (UPMS), apresentada por ele em 2003 durante o Fórum, representantes de movimentos sociais possuem um ambiente para dialogar. “Esse é o espaço para as lideranças tentarem se traduzir e compreender o que o outro está dizendo de fato. É o local para juntos definir uma única estratégia de luta”, comenta Aline. 
Cerimônia 
O ex-reitor da Universidade Federal da Bahia Naomar Almeida Filho; a professora e ativista uruguaia Lilian Celibertin, e a militante do movimento negro, Regina Nogueira, serão os expositores de motivo. De acordo com a docente da UCPel, cada convidado terá 20 minutos para expor os motivos de conceder o título de honoris causa à Boaventura. 
Além dos Conselho Universitários das Universidades, os reitores da UCPel, José Carlos Pereira Bachettini Júnior, e UFPel, Pedro Rodrigues Curi Hallal, estarão presentes no evento e também terão espaço de fala. 
Interessados em participar da cerimônia devem retirar senha no Teatro Guarany no mesmo dia do evento, a partir das 14h. As Universidades receberão cada uma 200 senhas para distribuição à comunidade acadêmica.  
Conheça um pouco mais a história do homenageado
Boaventura de Sousa Santos nasceu em 1940 e viveu parte significativa de sua vida sob a ditadura portuguesa. Fez o curso de Direito em Coimbra e Filosofia na Alemanha Oriental. No final da década de 1960 fez doutoramento em Sociologia do Direito na Universidade de Yale, nos Estados Unidos da América, onde desenvolveu o trabalho de investigação de sua tese sobre o pluralismo jurídico no Brasil a partir da Favela do Jacarezinho, no Rio de Janeiro. 
Em 1987 lançou o livro-referência “Um Discurso sobre as Ciências”, em que confronta com o paradigma da Ciência Moderna propugnando um outro paradigma a encarnar uma outra racionalidade. Nesta perspectiva, Boaventura apresenta um “pós-modernismo de oposição”, de natureza emancipatória, em uma perspectiva “pós-colonial” e “pós-imperial”. 
Nos anos 2000, propõe uma “Epistemologia do Sul”, como um novo paradigma a encarnar uma outra racionalidade ampla e abrangente, capaz de apreender a riqueza infinita e a diversidade da experiência social em todo o mundo. O “Sul” em Boaventura de Sousa Santos não é um sul geográfico e, sim, uma categoria sociopolítica relativa aos países, regiões, segmentos, grupos que sofrem processos de exclusão, opressão e discriminação. O “Sul” é uma metáfora do sofrimento humano, produzido nas hibridações do capitalismo e da colonialidade do poder. Na formulação de Boaventura Santos, “a Epistemologia do Sul” assenta-se em uma tripla orientação: “aprender que existe o Sul; aprender a ir para o Sul; aprender a partir do Sul e com o Sul”. 
Em tempos pós-modernos de fragmentações, de fluidez, de particularismos, de individualismos e indiferença, Boaventura de Sousa Santos apresenta a necessidade de uma “ciência comprometida com a emancipação” e difunde um “Conhecimento Prudente para uma Vida Decente”. 
Ao ancorar seu pensamento na crítica radical à modernidade ocidental, Boaventura alarga o horizonte desta crítica ao vincular capitalismo/colonialismo e amplia a concepção de dominação e de poder, articulando as formas de domínio do capital com as violências do colonialismo, materializadas em opressões e discriminações de diferentes ordens: étnicas, de gênero, de opção sexual, religiosas, de padrões estéticos… 
Nesta via analítica da dominação e do poder, Boaventura funda sua perspectiva emancipatória no princípio do reconhecimento da igualdade e da diferença: “defender a igualdade sempre que a diferença gerar inferioridade e defender a diferença sempre que igualdade implicar descaracterização”. 
Ainda nesta perspectiva, Boaventura resignifica o conceito de justiça e alega que “justiça social pressupõe a justiça cognitiva”. Mais precisamente: “não existe justiça social global sem justiça cognitiva global”. Assim, o “desafio de recriar a emancipação, no tempo presente de transição, é teórico, é político e é epistemológico”.
Daí surgem as epistemologias do sul que compreendem uma contribuição importantíssima para as ciências sociais, principalmente para a sociologia e para o direito, tendo em vista as premissas teóricas da linha abissal, sociologia das ausências, sociologia das emergências, o trabalho de tradução, a ecologia dos saberes, a artesania das práticas e muitas outras reflexões que tem sido referências importantes para o universo das ciências sociais, ciências políticas, educação e pedagogia. 
Redação: Rita Wicth – MTB 14101

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